Sabe moço, eu não posso mais ficar aqui nem mais um dia, moço. Já se  foram três folhinhas do calendário. Talvez (leia-se talvez e com um bom  bocado de sorte) você ainda se lembre do quanto eu amava você. Eu te  amava de maneira tão desesperada e tímida que acabava quase virando um  ódio. Eu te odiava porque eu nem imaginei que um dia eu pudesse gostar  tanto assim de alguém. Alias, talvez até imaginei, mas nessa minha  imaginação esse meu gostar era cem por cento recíproco. Então eu te  ignorava, eu não ligava pra você, eu não queria criar a menor  intimidade, eu tentei de um milhão de jeitos me proteger desse amor. E  ele só cresceu. Acho que até hoje, você nunca vai poder corresponder.  Sabe, moço, eu sei que essa distância dói quando a saudade aperta. Eu  tenho tanta saudade de sentir o meu coração pulando pra fora de mim  quando te vê que eu queria saber sentir isso por qualquer outra pessoa.  Eu queria saber que diabos meu coração via tanto em você. A meu ver,  moço, você sempre foi todo lindo. Eu amava você magrelo, amava você  cansado no fim do dia, eu amava você irônico, amava você cabeludo, amava  você careca. Acho que talvez eu nunca mais me apaixone tão  violentamente assim. Por isso eu sei que você nunca vai corresponder.  Porque se o fosse fazer já era em tempo, talvez você visse no meu  sorriso uma cura pra qualquer mal, talvez você pudesse reparar que o meu  gosto musical até que não é de seu todo ruim. Não te parece injusto que  você não se interesse nunca em tentar me conhecer pelo menos pra tentar  gostar um pouquinho de mim?! As vezes, eu acho que você deve me achar  tão esquisita por causa disso. Como eu posso gostar tanto de alguém  assim, tão claro, sendo que nem convivo, nem nunca convivi com você.  Gosto assim, puro e muito. Mas desculpa, moço. Eu sei que pode doer me  ver partir assim. Mas dói mais em mim partir assim com um peso tão  grande nas costas. Dói ter que andar por alamedas, ruas, avenidas e  temer cair se te encontrar na próxima esquina. Talvez eu tropece e nem  agüente a queda pois seria provocação fugir pra nunca mais te encontrar e  acabar te achando por ai. E, moço, acho que todo mundo merece uma  segunda chance pra se apaixonar. Então me deixa ir, moço. Só me arranja o  número do táxi pra quando eu descer em algum aeroporto bem longe eu  saiba o que fazer. Mas promete, olha nos meus olhos e diz que nunca mais  vai me procurar. Diz que vai tentar me deixar ser feliz, moço. Eu gosto  dessa brincadeira da gente fingir que não se conhece, eu gosto dessa  brincadeira de falar mais alto e rir mais alto pra mostrar pra você o  quanto eu sou feliz sem você. E você gosta dessa brincadeira de não dar a  mínima bola pra mim e por você, eu posso falar alto até em chinês que  você não se importa. Ou pelo menos finge que não se importa. Porque no  fim eu sei que dói me ver partir assim. Mesmo que inconscientemente eu  sei que dói. Então promete que vai me deixar por um tempo sem te  encontrar pra que eu possa me curar. Eu não quero te encontrar nem em  pensamento, nem em sonho, não quero encontrar nossa música e promete que  você vai deixar eu mudar de rádio assim que ela começar a tocar. Ou  talvez você queira parar a minha partida. Talvez você queira encontrar  no meu riso um motivo pra viver, talvez queira me abraçar forte e talvez  queira que a minha voz estridente se cale para que compartilhamos  daquele beijo que eu esperei a minha vida inteira. Aquele beijo que eu  procurei a minha vida todinha e ele nunca me pareceu certo. Eu sei que  ali, ele pareceria. Talvez se você tiver disposto a parar a minha queda,  talvez eu veja um bom motivo para não mais partir. Se nunca mais nós  nos tornamos essa metade da coisa, se nunca mais você deixar que eu me  perda assim, tão insana e tão banal, eu deixo você juntar o teu corpo  pro lado do meu. Porque sempre me pareceu doído ter que me desvencilhar  desse amor tão grande mesmo. Mas talvez você não queira nada disso, e eu  tenha mesmo que partir, mas por mim, tudo bem. Eu só queria um ultimo  abraço, viu, seu moço!? Sem muita intimidade, só pra que eu tenha algo  do que sentir uma saudades gostosa desse meu amor que eu costumava ter  por você.
 

 
 
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